
Programa - Comunicação Oral - CO2.8 - Desafios Contemporâneos da Segurança Alimentar e Nutricional no Brasil
02 DE DEZEMBRO | TERÇA-FEIRA
15:00 - 16:30
15:00 - 16:30
A ATUALIDADE DA OBRA DE JOSUÉ DE CASTRO PARA PENSAR A FOME NO BRASIL
Comunicação Oral
1 UFRGS
Apresentação/Introdução
A obra de Josué de Castro dedica-se aos estudos da fome, descrevendo a situação alimentar do Brasil. Ele define fome como fenômeno biológico de um problema social. Perseguido e censurado na ditadura militar, seu legado intelectual foi apagado das discussões sobre o tema. Atualmente, há um movimento de resgate de suas ideias que trazem sua inegável influência na ciência da nutrição.
Objetivos
Realizar uma análise crítica sobre o debate contemporâneo da fome à luz do pensamento de Josué de Castro, revisitando a atualidade de sua concepção teórica.
Metodologia
Foi realizada uma revisão integrativa da literatura nas bases de dados abertos SciELO, BVS e Google Acadêmico. Foram incluídos estudos qualitativos que abordassem a fome sob uma perspectiva social e contribuíssem para a análise crítica da atualidade do pensamento de Josué de Castro. Foram consideradas publicações em português, sem restrição de data. A estratégia de busca incluiu descritores como “fome”, “insegurança alimentar” e “Josué de Castro”, combinados por meio dos operadores booleanos “AND” e “OR”. Após leitura integral dos estudos selecionados, os dados foram organizados e analisados em cotejamento com a obra do autor.
Resultados
A análise dos estudos evidenciou que os discursos atuais sobre a fome mantêm relação com os fundamentos de Josué de Castro. Ao revisitar seu pensamento, observa-se que muitos dos fatores por ele apontados como causas da fome seguem presentes, como a concentração de riquezas, o latifúndio e a matriz produtiva agroexportadora. O agronegócio, estruturado em latifúndios e monoculturas, limita o acesso à terra e à produção de alimentos para o consumo interno. Castro afirmava que a fome é resultante de decisões motivadas por interesses políticos e econômicos, que negam a dignidade de parte da população. Sua concepção ampliada do fenômeno permite compreender as causas estruturais da fome no Brasil.
Conclusões/Considerações
O pensamento de Josué de Castro permanece relevante para a compreensão crítica da fome no Brasil. Sua conceituação, ao integrar aspectos biológicos e sociais, contribui para o entendimento da fome como um fenômeno complexo. O resgate de seu legado ainda é necessário e tem potencial para orientar políticas públicas que, reconhecendo as raízes estruturais do problema, proponham soluções articuladas que respondam às causalidades socioeconômicas.
AMBULATÓRIO DE NUTRIÇÃO INCLUSIVA COMO FERRAMENTA DE EQUIDADE EM SAÚDE PARA PESSOAS EM VULNERABILIDADE SOCIAL
Comunicação Oral
1 Universidade Federal Fluminense
Período de Realização
A experiência ocorreu entre agosto de 2024 e junho de 2025.
Objeto da experiência
Ambulatório de Nutrição Inclusiva (ANI), da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal Fluminense, Campus Valonguinho, Niterói-RJ.
Objetivos
Descrever o processo de estruturação e instalação do ANI, perfil dos usuários, bem como os aprendizados adquiridos no âmbito desse serviço que oferece assistência nutricional e dietoterápica gratuita a pessoas em vulnerabilidade social.
Metodologia
A estruturação do ANI iniciou-se em Agosto de 2024, com planejamento do espaço e layout, definição de protocolos de atendimento, produção de materiais educativos para uso nas consultas e submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa, por ser espaço de articulação serviço-ensino-pesquisa (CAAE: 77996024.0.0000.5243, Parecer 7.487.023). Foram realizados também atendimentos-piloto, visando avaliar a eficácia dos formulários e do fluxo de atendimento. A inauguração do serviço ocorreu em Abril de 2025.
Resultados
Dentre os 30 agendamentos, a maioria era pessoa transgênero (63%) ou com deficiência (22%), com idade média de 31,5 anos. Dentre os 19 atendimentos, 56% vivenciava risco de insegurança alimentar, 67% tinha excesso de peso, 57% apresentava lipidograma e pressão arterial alterados na consulta, e apenas 13,3% tinham consumo regular (≥5 vezes/semana) de alimentos saudáveis. Os objetivos de acompanhamento foram: alimentação saudável (58%), emagrecimento (26%) e controle de problemas de saúde (16%).
Análise Crítica
Houve grande interesse da comunidade, e rápido preenchimento das vagas, em sua maioria por pessoas com prejuízos na saúde e alimentação. Os atendimentos favoreceram a reflexão crítica sobre humanização, e trouxeram o desafio de lidar com demandas nutricionais específicas de pessoas transgênero e/ou com deficiência, bem como de planejar a alimentação na perspectiva da redução de danos frente à insegurança alimentar e nutricional e outras inúmeras desigualdades sociais vivenciadas pelos usuários.
Conclusões e/ou Recomendações
O ANI é uma estratégia efetiva para democratizar o acesso à assistência nutricional e dietoterápica por pessoas historicamente invisibilizadas nos diferentes serviços de saúde, bem como promover equidade em saúde, por meio de um cuidado nutricional qualificado. Considerando seu potencial, recomenda-se que esse tipo de serviço seja replicado também em outras instituições de ensino superior, bem como estruturado no âmbito do Sistema Único de Saúde.
FOME E OBESIDADE COMO FACES DA CRISE NO SISTEMA ALIMENTAR: RECOMENDAÇÕES SOB A ÓTICA INTERSECCIONAL E INTERSETORIAL PARA ATUAÇÃO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS EM NÍVEL LOCAL
Comunicação Oral
1 IMS UERJ/ Faculdade Souza Marques
2 Universidade Federal de Ouro Preto
3 Universidade Federal da Paraíba
4 Ministério da Saúde
5 Secretaria Estadual de Saúde do Mato Grosso do Sul
Apresentação/Introdução
No Brasil, fome e obesidade não são opostos, mas expressões de um mesmo sistema desigual. Mais de 21,6 milhões de domicílios enfrentam insegurança alimentar e 60,3% da população tem apresentado excesso de peso (IBGE, 2023; PNS, 2019). Projeções indicam agravamento até 2030. Este trabalho propõe respostas interseccionais sob a ótica de raça/cor, gênero, deficiência, sexualidade e classe social.
Objetivos
Sistematizar recomendações para mitigar a obesidade e fome sob uma abordagem interseccional e intersetorial no âmbito de políticas públicas sensíveis às desigualdades no contexto local.
Metodologia
Este trabalho baseia-se em revisão de literatura, análise de dados secundários e diretrizes de políticas públicas, com ênfase nos dados do VIGISAN (2022), PNS (2019), SISVAN (2024) e SIASI (2022). A análise considera desigualdades em saúde relacionadas a raça/cor, gênero, deficiência, orientação sexual e classe social. O conceito de sindemia global (Lancet, 2019) orienta a compreensão das conexões entre obesidade, fome e clima e as evidências sobre ambientes alimentares e desigualdades sustentam recomendações organizadas em três eixos: atenção à população, gestão pública e articulação intersetorial.
Resultados
A sistematização das recomendações ficou destacada em três frentes: 1)Na prática assistencial, propõe-se escuta ativa, atuação territorializada, diagnóstico com dados desagregados e valorização de saberes populares. 2) Na gestão pública, recomenda-se o uso de indicadores interseccionais, participação social e distribuição equitativa de recursos. 3) Na articulação de políticas, destaca-se a integração intersetorial, o fortalecimento de redes comunitárias e a formação profissional sensível à interseccionalidade.
Conclusões/Considerações
A prevenção da obesidade e erradicação da fome, exigem mais do que garantir o acesso à comida: é preciso transformar os sistemas alimentares com base na equidade. Neste sentido, as recomendações apresentadas neste trabalho reafirmam o compromisso com a construção de políticas públicas alinhadas com o direito humano à alimentação adequada e com reparação das desigualdades em confluência com ações do âmbito local ao nacional.
SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL NO TRABALHO DOMÉSTICO
Comunicação Oral
1 UFBA
Apresentação/Introdução
Algumas categorias de trabalhadores apresentam maior vulnerabilidade à Insegurança Alimentar e Nutricional, uma delas é a das trabalhadoras domésticas. Somente em 2023 a alimentação passou a ser considerada um direito trabalhista da categoria, todavia, sem dispositivos que garantam a efetiva materialização no plano cotidiano. Ademais, existe uma lacuna abismal na literatura acerca da temática.
Objetivos
Compreender as condições de trabalho e segurança alimentar e nutricional para trabalhadoras domésticas do município de Salvador.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, exploratória e analítica desenvolvida com 10 trabalhadoras domésticas residentes em Salvador, selecionadas por snowball. Os critérios de inclusão foram: ser maior de 18 anos e com ao menos um ano de serviço doméstico. O critério de exclusão: ser sindicalizada. A coleta dos dados ocorreu presencialmente, com emprego de entrevistas semiestruturadas, entre os meses de setembro de 2024 e janeiro de 2025. Para a análise dos dados, empregou-se o método da Análise de Conteúdo. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina, sob o Parecer n.º 7.057.657. Foi obtido o consentimento livre e esclarecido de todas as participantes.
Resultados
Foram identificados três núcleos de sentido principais: “Restos e Sobras”, “Fome e Mecanismos de Resistência” e “Dignidade Alimentar”. No primeiro, a onipresença dos “restos e sobras”, categorizados em: restos da mesa e restos do consumo semanal. Além disso, mecanismos de vigilância, um panóptico. No segundo, a fome como experiência comum a todas as vivências. Ela surgiu na forma aguda e como expressão simbólica. Ademais, os patrões decidiam a composição e tamanho das refeições. Salienta-se que táticas individuais e coletivas para superação da INSAN foram desenvolvidas pelas trabalhadas, como o aprovisionamento. No terceiro, situações de respeito à dignidade alimentar, como a comensalidade.
Conclusões/Considerações
O trabalho evidenciou que a alimentação no trabalho doméstico carece de respeito à Segurança Alimentar e Nutricional. As experiências podem ser resumidas em vivências de privação de acesso e violência material e simbólica. Resquícios da escravidão parecem definir as condições e relações de trabalho, comprometendo a alimentação. Todavia, as trabalhadoras encaram as situações com uma postura ativa, tateando formas de resistir ao comer indigno.
“NÓS JOVENS, SOMOS PLURAIS. EXISTIMOS E RESISTIMOS” - DIÁLOGO COM AS JUVENTUDES SOBRE AÇÕES, POLÍTICAS E PESQUISAS EM SOBERANIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (SSAN)
Comunicação Oral
1 UFRJ
2 UFLA
3 UNIRIO
4 UFPR
5 FIOCRUZ
6 IFF
Período de Realização
Atividade realizada em 10/09/2024 no VI Encontro Nacional de Pesquisa em SSAN.
Objeto da experiência
Atividade autogestionada, organizada por 5 coletivos e movimentos sociais de juventudes, que dialogaram sobre Direitos Sociais e SSAN
Objetivos
A oficina teve como objetivo promover um espaço de diálogo com juventudes e organizações que atuam com este público para pensar e delinear ações, indicar temas de pesquisa e demandas para políticas públicas, pela perspectiva das juventudes, visando a incidência política na agenda da SAN.
Descrição da experiência
Atividade organizada em 4 momentos: 1) dinâmica de apresentação; 2) falas inspiradoras considerando diversas realidades, interesses e vulnerabilidades de jovens nos territórios. 3) Dinâmica World Café em três eixos de diálogos alinhados com as juventudes: políticas de SAN; temas prioritários para pesquisa; e estratégias de mobilização; 4) Sistematização dos diálogos e escrita coletiva de Carta Manifesto com opiniões e propostas para o campo da SAN.
Resultados
Dos resultados destacam-se: a) Carta Manifesto com demandas para ações e políticas como “Queremos autonomia e emancipação para ser e viver nesse país tão desigual” e “O desafio é a articulação das políticas para termos um Sistema Nacional de Juventudes de verdade”; e para pesquisa “é essencial considerar as juventudes, valorizar a ciência cidadã e integrar, de verdade, os saberes científico e popular”; b) Criação do GT Juventudes e SSAN na Rede de Pesquisa em SSAN (Rede PENSSAN).
Aprendizado e análise crítica
A pluralidade das juventudes de diferentes contextos oportunizou compartilhamentos e o reconhecimento de oportunidades e desafios das intersecções entre as pautas juventudes e SSAN. A leitura da Carta Manifesto na Plenária do VI ENPSSAN, como ação de incidência política, resultou na criação do GT Juventudes e SSAN, concretizando a demanda de um espaço de articulação de jovens, que potencialize seu caráter crítico e inventivo, democratizando a ciência e possibilitando um diálogo intergeracional.
Conclusões e/ou Recomendações
Diante dos desafios para o enfrentamento da insegurança alimentar e nutricional e a promoção da alimentação adequada e saudável no contexto das juventudes, é necessário construir COM e não PARA as juventudes. A oficina teve a intenção de abrir espaço para reflexão e proposição de ações, políticas e pesquisas na interface Juventudes e SSAN, sendo uma oportunidade de exercitar o protagonismo das juventudes e a incidência política na agenda pública.
A INTERFERÊNCIA DO SETOR PRIVADO COMERCIAL NO ENFRENTAMENTO DA FOME NO BRASIL: UMA ANÁLISE A PARTIR DE MATÉRIAS JORNALÍSTICAS
Comunicação Oral
1 Universidade do Estado do Rio de Janeiro
2 Universidade Federal Fluminense
Apresentação/Introdução
A fome, expressão mais grave da Insegurança Alimentar, é reconhecida como consequência de determinantes sociais e estruturais. O recente debate sobre os Determinantes Comerciais da Saúde (DCS) e a interferência negativa do setor privado comercial (SPC) no campo da alimentação e nutrição colocam-se como importantes abordagens ainda pouco discutidas na agenda de enfrentamento da fome.
Objetivos
Analisar a interferência de atores comerciais na agenda nacional de enfrentamento da fome nos anos de 2023 e 2024 a partir do discurso em sites jornalísticos.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa documental guiada por núcleos investigativos baseados no modelo dos DCS e na teoria do discurso com base na análise de matérias jornalísticas do O Globo, Estadão, Folha de São Paulo e Correio Braziliense publicadas entre 2023 e 2024. Foram selecionadas as matérias que expressavam diretamente o discurso do SPC sobre a agenda de enfrentamento da fome, usando-se palavras-chave que se referiam à agenda e aos atores desse setor. As matérias selecionadas foram sistematizadas em planilha do Microsoft Excel® com categorização dos atores do SPC e análise qualitativa dos principais temas abordados nos seus discursos.
Resultados
Foram encontradas 73 matérias jornalísticas com uma grande variedade de atores do SPC abordando a agenda, como o varejo de alimentos, indústrias de produtos alimentícios ultraprocessados, o setor financeiro e o agronegócio. Foi identificada uma expressividade de aliados ou possíveis aliados desses setores que atuam como fundações, associações e/ou institutos, com destaque para o Instituto Pacto Contra a Fome. Dentre as principais temáticas, destacam-se o discurso de uma frente ampla para a solução da fome, com uso do poder do SPC para enfrentá-la e a articulação com a agenda climática com soluções de redução de resíduos que focalizam na destinação de alimentos que seriam desperdiçados.
Conclusões/Considerações
Percebe-se um grande interesse do SPC na agenda de enfrentamento da fome com um discurso que visa indicar como e por meio de quais atores a fome deve ser solucionada, incluindo o SPC e suas medidas como parte essencial para o seu enfrentamento. É fundamental avançar na análise das práticas e estratégias comerciais utilizadas pelo setor e como estas podem influenciar negativamente as políticas estruturantes de Segurança Alimentar e Nutricional.

Realização: