
Programa - Comunicação Oral Curta - COC32.2 - Corpos que Migram, Vidas que Resistem: Mulheres Entre Fronteiras, Saúde e Dignidade
02 DE DEZEMBRO | TERÇA-FEIRA
08:30 - 10:00
08:30 - 10:00
ABORTO LEGAL EM CASOS DE STEALTHING NO BRASIL: REFLEXÕES PARA UM DEBATE CONTEMPORÂNEO
Comunicação Oral Curta
1 Instituto Fernandes Figueira e Universidade Federal de Mato Grosso
2 Instituto Fernandes Figueira
Apresentação/Introdução
Stealthing é o ato em que o homem retira o preservativo durante a relação sexual sem o consentimento da mulher. Sabe-se que o uso do preservativo previne ISTs e a gravidez. Neste contexto, o stealthing pode resultar em uma gravidez não planejada, com implicações pessoais e de saúde sexual e reprodutiva. Em termos legais, não há legislação que aborde a prática no Brasil
Objetivos
Discute-se a necessidade de viabilidades jurídicas de acesso ao aborto legal no Brasil a partir de um caso de uma jovem de 25 anos que foi vítima de stealthing, engravidou e sem apoio legislativo e jurídico, decidiu recorrer a um aborto ilegal
Metodologia
Trata-se de um recorte do primeiro estudo nacional sobre stealthing no país, realizado em duas etapas. Na etapa quantitativa, 2.876 vítimas de stealthing responderam um questionário online. Na etapa qualitativa, dez mulheres que haviam respondido ao questionário da primeira fase participaram de uma entrevista individual. Daniela (nome fictício) tinha 33 anos no momento da entrevista, autodeclarou-se parda, católica e heterossexual. Ela morava em Manaus, tinha pós-graduação e ganhava quase seis salários mínimos. Daniela engravidou aos 25 anos de idade após ter sido vítima de stealthing. A partir da gravidez indesejada e da falta de apoio judicial e lesgislativo, recorreu a um aborto ilegal
Resultados
Daniela tinha 25 anos na época. Conheceu o parceiro através de um aplicativo. Foram a um bar e em seguida, Daniela foi à casa do rapaz. A jovem pediu o uso do preservativo, no qual o homem concordou. No final da relação sexual, Daniela percebeu que ele havia ejaculado internamente e retirado o preservativo durante a relação sexual sem o seu consentimento. Mesmo com o uso da pílula do dia seguinte, testou positivo para a gravidez. Daniela foi à delegacia para recorrer a um aborto legal, onde não foi escutada ou amparada. Logo após, uma amiga médica a apoiou e a ajudou a conseguir medicação através da internet. Concretizou o aborto em casa e sozinha, com muitas dores e sentindo-se desamparada
Conclusões/Considerações
Apesar da lacuna de leis sobre stealthing, a legislação brasileira já determinou o que é violência sexual. As legislações vigentes são suficientes para caracterizar a prática como violência sexual, como estupro ou violação sexual mediante fraude, tal qual estabelecem a Lei Maria da Penha, o artigo 128 do Código Penal, em seus incisos I e I e o o artigo 215 do Código Penal, com objetivo de amparar as mulheres vítimas dessa violência sexual
ATUAÇÃO DE OBSTETRIZES NAS EMERGÊNCIAS CLIMÁTICAS: RELATO DE EXPERIÊNCIA DO PROJETO VOLUNTÁRIO “SOS OBSTETRIZES” NA CIDADE DE CANOAS (RS)
Comunicação Oral Curta
1 EACH - USP
2 FSP - USP
3
Período de Realização
Realizado entre maio e junho de 2024, durante a calamidade pública provocada pelas enchentes no RS.
Objeto da experiência
Atendimento pré-natal e puerperal por Obstetrizes em abrigos de Canoas (Rio Grande do Sul) diante da maior crise climática já vivida no estado.
Objetivos
Criar e executar uma estratégia voluntária e itinerante, com foco em saúde sexual e reprodutiva, para mapear e atender gestantes, puérperas e seus recém-nascidos em mais de 90 abrigos de Canoas, promovendo o vínculo com a rede pública e a continuidade do cuidado durante a calamidade.
Descrição da experiência
Liderado por 12 obstetrizes e com participação de outros profissionais de saúde, o projeto surgiu pela demanda de um grupo de trabalho com olhar atento às necessidades de saúde sexual e reprodutiva em meio às enchentes que afetaram milhões no Rio Grande do Sul. Financiado exclusivamente através de doações, o trabalho atuou de maneira itinerante com atendimento às usuárias, restabelecimento de vínculos e encaminhamento para a Secretaria Municipal de Saúde e Atenção Básica do município de Canoas.
Resultados
O projeto mapeou 62 abrigos, identificou e atendeu 94 gestantes, 39 de alto risco. Com 70% das UBSs inoperantes e grande dificuldade de locomoção pela cidade, muitas estavam com pré-natal incompleto. Em 34 dias, foram realizados 256 atendimentos por obstetrizes, incluindo consultas pré-natais, pós-parto e aconselhamento reprodutivo, todos registrados no sistema da Secretaria Municipal de Saúde. Também desenvolveu recomendações aos órgãos públicos sobre os riscos de saúde incitados pela crise.
Aprendizado e análise crítica
A experiência reforça que equipes treinadas e autônomas, capazes de atuar fora de estruturas físicas fixas, podem contribuir para a flexibilização e otimização do cuidado em saúde em meio a crises. A integração com a Secretaria de Saúde e profissionais locais foi decisiva para garantir o registro adequado e a continuidade do cuidado. A atuação fundamentada em evidências e protocolos fortaleceu a articulação com a rede e mostrou a potência das obstetrizes na linha de frente das emergências.
Conclusões e/ou Recomendações
Estratégias de cuidado às gestantes, puérperas e recém-nascidos devem integrar os planejamentos de resposta dos sistemas de saúde às crises climáticas. O projeto demonstrou que a inserção de obstetrizes nesse sistema, por sua atuação segura, sustentável e baseada em evidências, é eficaz para a garantia de direitos sexuais e reprodutivos, inclusive em contextos de calamidade.
GESTA (R) NAS RUAS: CORPOS QUE GERAM, VIDAS QUE RESISTEM
Comunicação Oral Curta
1 Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz)
Apresentação/Introdução
A maternidade em situação de rua expõe processos de estigmatização que patologizam a pobreza, violências estruturais materializadas na precarização do cuidado, e a contradição fundamental entre o direito à cidade e sua apropriação desigual. Para essas mulheres, a maternidade se desdobra em uma experiência onde seus corpos se tornam mapas de abandono institucional e espaços de insurgência cotidiana.
Objetivos
Analisar os sentidos e vivências da maternidade de mulheres em situação de rua no município do Rio de Janeiro, explorando expectativas e identificando os desafios e estratégias para garantir o pleno exercício desse direito fundamental.
Metodologia
Trata-se de um estudo exploratório de cunho qualitativo descritivo realizado no município do Rio de Janeiro. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com mulheres que vivenciaram a gestação nas ruas da cidade, nos últimos quatro anos, selecionadas por uma amostra de intencionalidade, por meio do reconhecimento prévio dessas mulheres pelas equipes de Consultório na Rua (eCR). A imersão no campo ocorreu por meio do acompanhamento in loco das atividades da eCR, permitindo uma aproximação contextualizada com o cenário estudado, enriquecendo a análise dos dados coletados. Os dados foram submetidos à análise temática de conteúdo.
Resultados
O estudo concluiu que as mulheres com trajetória de rua enfrentam desafios muito complexos. A análise destaca quatro dimensões centrais das experiências analisadas: Maternidades Plurais como oportunidade de reconstrução identitária ou fonte de angústia; Estratégias de sobrevivência e resistência; Barreiras no acesso ao cuidado integral em saúde e a Violência de Gênero, que se manifesta em um cuidado desumanizado, no descaso institucional e em diversas outras violências que as atravessam. Diante dessas realidades, a pesquisa ressalta o papel fundamental das eCR na promoção de cuidados adequados e defesa de políticas intersetoriais para garantir direitos fundamentais.
Conclusões/Considerações
Mulheres que vivenciam a gravidez nas ruas enfrentam, além do estigma e da invisibilidade, o medo constante da perda dos filhos.A ausência de políticas integradas de saúde, moradia e inclusão produtiva as mantém num ciclo perverso de exclusão.Esta realidade demanda intervenções que garantam direitos básicos e proteção social efetiva, substituindo a criminalização da pobreza pelo seu reconhecimento como sujeitos de direitos, garantindo dignidade.
MATERNIDADE TRANSNACIONAL DE VENEZUELANAS MIGRANTES RESIDENTES NO BRASIL
Comunicação Oral Curta
1 ENSP/Fiocruz
Apresentação/Introdução
A migração venezuelana para o Brasil se intensificou a partir de 2014 e metade deste fluxo migratório é composto por mulheres. Neste contexto de migração forçada em busca por melhores condições de vida, muitas mulheres deixaram filhos em seu país de origem. A maternidade transnacional demanda novos arranjos de cuidado familiar e tem consequências na vida de mães e filhos.
Objetivos
Descrever o perfil sociodemográfico, migratório e de saúde de mulheres migrantes venezuelanas residentes no Brasil que deixaram pelo menos um filho na Venezuela, comparando com aquelas que não precisam deixar filhos na Venezuela.
Metodologia
Este estudo utiliza dados do projeto ReGHID, que investigou a saúde sexual e reprodutiva de mulheres migrantes venezuelanas no Brasil. Este inquérito realizado em 2021 com mulheres venezuelanas entre 15 e 49 anos que residiam em Manaus e Boa Vista. A amostragem utilizou o método Respondent Driven Sampling (RDS) e incluiu um total de 2012 mulheres. Foram calculadas prevalências relativas, estratificadas pela variável “deixou filho na Venezuela”. O teste de χ² com significância de 0,05 foi utilizado para analisar a homogeneidade das proporções. Todas as análises consideraram a amostragem complexa utilizando-se o software SPSS.
Resultados
A maioria das mulheres possuía ensino médio completo, tinha companheiro, morava em abrigos, tinha situação migratória regularizada. As mulheres que deixaram filhos eram significativamente mais velhas, tinham maior paridade e uma maior proporção migrou sozinha comparadas àquelas que não deixaram. Apesar da baixa prevalência de tabagismo e de uso de álcool, a proporção foi significativamente maior para aquelas que vivenciavam a distância com os filhos. Da mesma forma, relataram mais trabalho remunerado no último mês (32%) e envio de ajuda financeira para a Venezuela (46%). A autoavaliação de saúde foi pior para este grupo. Não houve diferença significativa no uso de serviços de saúde.
Conclusões/Considerações
A maternidade transnacional é um fenômeno mundial e atual. Mulheres que vivenciam este tipo de cuidado tendem a apresentar pior autoavaliação de saúde e piores hábitos de vida. O SUS deve considerar este fenômeno para garantir um atendimento que considere as particularidades e aspectos culturais desta população.
PROGRESS IN MATERNAL AND NEWBORN HEALTH USING A COMPOSITE INDICATOR IN LOW- AND MIDDLE-INCOME COUNTRIES (2010-2022)
Comunicação Oral Curta
1 International Center for Equity in Health, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Brazil
2 Centre for Global Child Health, The Hospital for Sick Children, Toronto, Canada
Apresentação/Introdução
Adequate antenatal, delivery, and early postnatal care are essential Maternal and Newborn Health (MNH) interventions to reduce morbidity and mortality through early prevention, detection, and management of complications. However, some low- and middle-income countries (LMICs) continue to face challenges in delivering accessible and high-quality MNH services, leaving significant gaps in care.
Objetivos
To assess progress in MNH care using the Maternal and Newborn Health Composite Indicator (MNHci) in LMICs over the past 15 years.
Metodologia
We used data from nationally representative surveys conducted in LMICs to estimate the MNHci, which includes three key interventions: four or more antenatal care visits, institutional delivery, and postnatal care for the woman or baby within two days of birth. The MNHci is a count-based score from zero to three, with one point assigned per intervention received. To assess progress over time, we analyzed the proportion of women–baby dyads receiving all three interventions in countries with at least two surveys conducted since 2010, with a difference of five years between the latest and the earliest.
Resultados
We identified 51 countries with more than one available survey and at least a five-year gap between the earliest and most recent data. Considering the proportion of woman-baby dyads who received all interventions, 43 countries showed increased coverage. Notably, Rwanda, Zimbabwe, Burkina Faso, Nepal, and Kenya achieved gains of over 30 percentage points. The most substantial improvements occurred in countries with lower baseline coverage. However, eight countries experienced declines, mostly small, except for São Tomé and Príncipe, where a significant drop in antenatal care (four or more visits) led to reduced overall coverage.
Conclusões/Considerações
While many countries have made progress in expanding MNH intervention coverage, particularly those that started with lower levels, coverage still remains below desired levels even in countries showing good progress. This highlights the ongoing need for sustained investment and robust monitoring systems. Ensuring equitable access to MNH services requires continued effort to address existing gaps and prevent any stagnation in progress.
VULNERABILIDADE E REEXISTÊNCIA: MULHERES MIGRANTES INTERNACIONAIS, SAÚDE E PANDEMIA EM UMA CIDADE DO CENTRO-OESTE BRASILEIRO
Comunicação Oral Curta
1 Instituto de Saúde Coletiva/Universidade Federal de Mato Grosso
Apresentação/Introdução
Quando as fronteiras se fecharam, não foi apenas contra o vírus. Fecharam-se portas, ouvidos, direitos. Este estudo nasce da escuta comprometida de mulheres migrantes em Cuiabá/MT, 2022, atravessadas pela pandemia e por dispositivos cotidianos de negação. Estrelas em travessia, revelam a potência da vida onde muitos veem apenas carência.
Objetivos
Compreender, a partir da escuta, como mulheres migrantes internacionais vivenciaram a pandemia, entre vulnerabilidades e resistências, tensionando os limites entre proteção, exclusão e reexistência no contexto de política pública marcada pela necropolítica.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada com oito mulheres migrantes, haitianas e venezuelanas residentes em Cuiabá/MT, participantes do projeto “Acesso à saúde e vulnerabilidades de migrantes internacionais no contexto da Covid-19”. As entrevistas semiestruturadas foram analisadas por Análise Temática (Braun e Clarke), com abordagem crítica, feminista e decolonial. As interlocutoras foram nomeadas com nomes de estrelas, em gesto ético-estético que valoriza suas narrativas e recusa reduzi-las a números. A escuta foi guiada por uma perspectiva interseccional, considerando gênero, raça, classe e condição migratória como eixos de produção de desigualdades e como potências de reinvenção e denúncia.
Resultados
As falas revelam precariedade nas relações de trabalho informais, instabilidade habitacional e insegurança alimentar, agravadas por racismo, xenofobia e machismo que as excluem e silenciam. “Eu choro. Não tem ninguém pra mim conversar” (Vega). A precariedade da moradia: “Dormíamos no chão, sem cama” (Rigel) - facilitou o contágio: “Dormia juntos. Pegamos Covid” (Sirius). Xenofobia e informalidade: “Venezuelana, não. Aqui trabalham só brasileiros” (Rigel). O acesso à saúde com longas esperas: “Tem que esperar muito tempo, muito tempo para poder atender” (Capella). A insegurança alimentar: “Como que faz para conseguir dar comida?” (Procyon). Ainda assim, resistem ao abandono estatal.
Conclusões/Considerações
A pandemia escancarou, mas não criou, exclusões estruturais que moldam vulnerabilidade de mulheres migrantes. Frente a necropolítica, suas vozes denunciam uma saúde colapsada, mas também anunciam outras formas de existir. É urgente construir políticas públicas com elas, e não apenas para elas - reconhecendo-as como produtoras de saberes, protagonistas da reexistência e essenciais para uma saúde coletiva plural, justa e verdadeiramente democrática.
INDICADOR DE FRAGILIDADE DO ESTADO E SUA ASSOCIAÇÃO COM COBERTURA E DESIGUALDADES EM SAÚDE REPRODUTIVA E MATERNO-INFANTIL: UMA ANÁLISE DE 93 PAÍSES
Comunicação Oral Curta
1 Centro Internacional de Equidade em Saúde- UFPel e Programa de Pós- Graduação em epidemiologia- UFPel
2 Programa de pós-graduação em tecnologia em saúde- PUC/ Paraná
3 Centro Internacional de Equidade em Saúde- UFPel e Departamento de epidemiologia- USP
4 Programa de pós-graduação em Saúde Pública- UFPR
5 Centro Internacional de Equidade em Saúde- UFPel
Apresentação/Introdução
Alcançar a cobertura universal em saúde é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030. Determinantes sociais de saúde, como viver em contextos de fragilidade estatal, podem causar menores coberturas e maiores desigualdades.
Objetivos
Investigar a associação entre a cobertura e desigualdade do Índice de Cobertura Composta (ICC) e o Índice de Fragilidade dos Estados (IFE), utilizando um delineamento ecológico.
Metodologia
Dados de saúde infantil foram obtidos de inquéritos probabilísticos nacionais. O ICC é uma média ponderada oito indicadores relacionados à saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil. O IFE mede o risco de fragilidade estatal, avaliando a coesão, economia, política, questões sociais e intervenção externa dos países por meio de 12 indicadores (10 pontos cada); maiores valores indicam maior fragilidade. O ICC foi calculado por quintis de riqueza (Q1 – mais pobres e Q5 – mais ricos) e o Índice absoluto de desigualdades (IAD) foi utilizado para resumir desigualdades absolutas. A associação foi testada por meio de regressão linear com ICC em nível nacional e Q1 e Q5.
Resultados
Foram incluídos 93 países de baixa e média renda. O ICC foi maior entre os mais ricos em 89 países, expresso por valores positivos do IAD. As maiores desigualdades ocorreram na Angola (IAD: 59.2 pp; IC 95% 57.0 a 61.4). A mediana do IFE foi de 80.4, sendo maior na República Centro-Africana (111.6) e menor na Costa Rica (43.2). A cada aumento de 10 pontos no IFE, a cobertura foi, em média, 6,5pp menor (IC 95% -9.8 a -3.3). Maior magnitude foi observada no Q1 (-8.4; IC 95% -12.7 a -4.1) em comparação ao Q5 (-3.4; IC 95% -5.7 a -1.1). Houve moderada associação inversa entre o IFE e o PIB per capita (r=-0.50, p<0.001).
Conclusões/Considerações
Quanto maior a fragilidade estatal, menor a cobertura e maiores as desigualdades. A magnitude da associação foi maior para o quintil mais pobre. Países mais frágeis, precisam de reforço em políticas públicas e fortalecimento de programas direcionados à saúde materna e infantil. Sendo estes países em sua maioria extremamente pobres, é essencial aumentar o influxo de recursos internacionais para garantir altas coberturas de intervenções essenciais.
CAPACITISMO MIGRATÓRIO E SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL
Comunicação Oral Curta
1 ENSP/Fiocruz
2 CIDACS/Fiocruz
3 CIDACS, Fiocruz
Apresentação/Introdução
O resumo decorre da pesquisa “Proteção social aos imigrantes com deficiência”, desenvolvida em unidade de pesquisa sobre desigualdades e saúde. O achado sintetizado corresponde à relação entre o capacitismo presente na burocracia migratória nacional e as práticas de saúde pública incorporadas no processo de recepção dos imigrantes com deficiência que chegavam ao país, a partir da década de 1920.
Objetivos
Compreender as escolhas e narrativas do Estado brasileiro nos processos relacionados à intersecção entre imigração e deficiência.
Metodologia
Estudo qualitativo, descritivo e exploratório, baseado em procedimentos de pesquisa documental. Buscas foram realizadas entre fevereiro e julho de 2024, em plataformas do Congresso Nacional, Superior Tribunal Federal (STF), Governo Federal e Organização das Nações Unidas. Usamos as palavras-chave: imigrantes com deficiência; migrantes internacionais com deficiência; deficiência; migração; incapacidade, versões em inglês e espanhol, sem filtrar ano de publicação. Adicionalmente, recuperamos normativas citadas nos primeiros dispositivos acionados, em perspectiva de “bola de neve”. Análises foram realizadas à luz das gramáticas do capacitismo (Moreira et al 2022) nas dobras com imigração.
Resultados
Pessoas com deficiência – aleijados, loucos, cegos, mutilados, mentalmente afetados e incapazes de trabalhar (Brasil, 1921; 1923) – não podiam entrar no país, sendo sujeitas à repatriação perante fiscalização sanitária e avaliação médica (Brasil, 1923; 1924; 1938). Entre 1960-1990 dispositivos médicos de avaliação da capacidade foram aplicados durante o desembarque no país, visando restringir a entrada das pessoas com “defeito físico” ou “mutilação grave” com incapacidade “superior a 40%”, exceto para imigrantes “qualificados” não perigosos para a saúde pública (Brasil, 1965). Orientações das Nações Unidas não têm repercutido nas normativas nacionais quanto aos imigrantes com deficiência.
Conclusões/Considerações
O imigrante com deficiência foi considerado “indesejável” sob um aparato normativo capacitista e eugênico baseado na racionalidade médica ocidental e reforçado pela preocupação com despesas estatais para sua subsistência (Mitchell; Snyder, 2003; Koifman; 2012; Marques; Carvalho, 2022; Dias, 2023). O Brasil não possui dados populacionais públicos sobre o grupo, aspecto que reforça sua invisibilidade, desigualdades e desproteção social.
ESTRATÉGIAS E RECONFIGURAÇÕES NA ASSISTÊNCIA À SAÚDE FRENTE À CRISE MIGRATÓRIA VENEZUELANA EM MANAUS E BOA VISTA
Comunicação Oral Curta
1 UFMA
Apresentação/Introdução
Recentemente a migração de venezuelanos para o Brasil atinge números impressionantes. Entre 2017 e 2024, o país recebeu mais de 558 mil migrantes, sendo quase metade mulheres. O aumento repentino da demanda pressionou as redes locais, sobretudo na região norte, onde se concentram os fluxos migratórios. Esse processo impôs transformações à estrutura e dinâmica dos serviços de saúde.
Objetivos
Compreender as estratégias adotadas e as reconfigurações na assistência à saúde em Manaus e Boa Vista diante da crise migratória venezuelana, a partir da percepção de profissionais e gestores
Metodologia
Trata-se de pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória, recorte específico de pesquisa multicentrica ReGHID. Foram analisadas 54 entrevistas com profissionais e gestores da saúde em Boa Vista (32) e Manaus (22), realizadas entre 2020 e 2022, de forma online (em virtude da pandemia de Covid) e presencial (em seu arrefecimento). A amostragem foi intencional, considerando falas sobre o atendimento a mulheres migrantes venezuelanas. Utilizou-se roteiro semiestruturado e Análise Temática Reflexiva em Braun e Clarke, com apoio teórico de Bourdieu. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética (CAAE 35617020.9.1001.5087), conforme as normas do CNS, e todos os participantes assinaram o TCLE.
Resultados
Da análise emergiram 2 categorias: Reconfiguração e embates no campo da saúde e Mobilização de capitais e ajustamento de habitus. A primeira aponta a entrada de novos agentes (ONGs, agências humanitárias e religiosas) no campo da saúde, alterando hierarquias e gerando conflitos de poder, mas também redistribuindo capitais simbólico e econômico para mitigar deficiências do SUS. A segunda evidencia estratégias profissionais frente à desigual distribuição de capitais linguístico e cultural, como uso de tradutores, cartazes em espanhol, facilitadoras Warao, ações educativas sobre SUS e SSR, e flexibilização documental.
Conclusões/Considerações
Os resultados revelam não apenas adaptações pontuais, mas disputas e ressignificações no interior do campo da saúde, diante de uma crise ao mesmo tempo, humanitária, institucional e política. A presença de migrantes escancara as fragilidades do SUS nas fronteiras, pois estas barreiras não se resume a traduzir palavras ou flexibilizar protocolos, exige reestruturação ética e política vistas a permitir o direito a saúde com integralidade do cuidado.
PERCEPÇÕES DE GESTORES SOBRE O (DES)ENCONTRO DE AÇÕES PÚBLICAS E NÃO ESTATAIS NA ATENÇÃO A MULHERES MIGRANTES EM TERRITÓRIOS DE FRONTEIRA
Comunicação Oral Curta
1 UFMA
Apresentação/Introdução
A migração de venezuelanas, impulsionada pela crise humanitária no país de origem, tem gerado desafios à organização dos serviços de saúde nos territórios de fronteira brasileiros. A organização da resposta institucional se depara com as limitações das políticas públicas, demandando a articulação entre ações governamentais e iniciativas não estatais para garantir o acesso e a qualidade da atenção.
Objetivos
Analisar as percepções de gestores sobre os limites, potencialidades e articulações entre ações públicas e não estatais na rede de atenção à saúde voltada a mulheres venezuelanas migrantes em Boa Vista (RR) e Manaus (AM).
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, exploratória, cujos participantes foram 16 gestores de instituições públicas e organizações não governamentais com atuação em Boa Vista (RR) e Manaus (AM) na assistência a migrantes venezuelanas, selecionados por amostragem intencional. A coleta de dados foi por entrevista semiestruturada e a análise na modalidade temática, que permitiu a construção de três categorias: (1) limites institucionais e descontinuidade da assistência; (2) papel das organizações não estatais e cooperação internacional; (3) percepções sobre articulação intersetorial e compartilhamento de responsabilidades.
Resultados
O relato dos gestores revela limitações importantes na capacidade da rede pública em responder às demandas de saúde de mulheres migrantes, marcadas pela ausência de protocolos específicos, descontinuidade das ações e baixa institucionalização do cuidado. Observa-se uma dependência de parcerias com organizações não governamentais e agências internacionais, que, embora ampliem o acesso em situações emergenciais, operam de forma fragmentada e muitas vezes desarticulada com os serviços públicos. A indefinição de responsabilidades, a sobreposição de iniciativas e a escassez de espaços de planejamento conjunto geram instabilidade, dificultam a coordenação e comprometem a integralidade do cuidado.
Conclusões/Considerações
As percepções dos gestores revelam que a atenção às mulheres migrantes é permeada por encontros pontuais e desencontros estruturais entre serviços públicos e ações não estatais. A atuação conjunta, embora necessária, carece de diretrizes comuns, integração efetiva e espaços de diálogo contínuo. O fortalecimento dessa interlocução é essencial para consolidar uma rede de cuidado mais integrada e responsiva.

Realização: